sábado, 7 de julho de 2007

O samba conquista a terra dos samurais



Ele poderia passar desapercebido nas ruas de qualquer cidade brasileira. O japonês Katsunori Tanaka, 47 anos, pode ser reconhecido pelos traços orientais, a bermuda e a camiseta despojadona, pulando de um botequim e outro, sempre com um copo de chopp numa das mãos.

Até aí tudo bem. Mas se de repente, como alguém que não quer nada, ele começasse a cantar um sambinha esperto? Sambinha? Sim, o cara é uma das maiores autoridades no assunto em seu país de origem.

Tanaka parece ter saído de um livro de contos de fada. O ex-cozinheiro de origem humilde travou seu primeiro contato com o gênero em 1978, numa loja de discos de Tókio, quando passou a colecionar bolachões de gente graduada: Cartola, Martinho da Vila, Beth Carvalho, entre outros.

Enfeitiçado pelos sons e a poesia de grandes mestres dos morros e Escolas de Samba do Rio de Janeiro, Tanaka, de fã incondicional passou a produtor de discos do gênero. Uma fase febril de sua vida que durou cinco longos anos (1986 a 1991).

Tempo suficiente pare deixar registrado 12 tesouros musicais no Brasil. Nove deles - “Doce Recordação” (Velha Guarda da Portela, 1986), “Peso na Balança” (Wilson Moreira, 1986), “Folhas Secas” (Guilherme de Brito, 1988), “Homenagem a Paulo da Portela” (Velha Guarda da Portela, 1989), “Mangueira Chegou”, (Velha Guarda, 1989), “A Voz do Samba” (Monarco, 1991) e “Resgate” (Cristina Buarque, 1994), ganham sua primeira versão digital no Brasil.

A gravadora Atração Fonográfica, responsável pelos lançamentos, ainda negocia com os herdeiros de alguns compositores das músicas dos discos para concluir o acerto dos direitos autorais.

Outras produções assinadas por Tanaka, como “Encanto da Paisagem” (Nelson Sargento) e “Okolofé” (Wilson Moreira), já estão sendo comercializados pela gravadora Rob Digital. Desfilam na avenida ainda “Velhas Companheiras (Monarco, Guilherme de Brito e Nelson Sargento) e “Uma História do Samba” (Monarco).

Amor & Conhecimento

Tanaka reconhece nesta aventura pelo gênero genuinamente brazuca uma forma de conhecimento, “O samba é uma música estrangeira que só conheci quando tinha 16 ou 17 anos de idade. Comecei a apreender Português só depois. Não era tão fácil entender direitinho essa música, por isso, foi uma grande experiência para mim fazer estes discos”, conclama de peito aberto nos encartes.

Num país dominado pelo carisma e o estilo clean da bossa nova, como é o caso do Japão (que o diga João Gilberto, Roberto Menescal e Marcos Valle) o produtor japonês almeja, sem muitas pretensões, propagar cada vez mais a malícia e o gingando do samba entre o público oriental.

Enquanto prepara novos lançamentos no Brasil, Tanaka encontrou um tempinho em sua agenda para bater um papo com nossa reportagem. Perguntas e respostas cruzaram o mar do Pacífico através de e-mail nas últimas semanas. O desejo era um só: desvendar um pouco da visão deste estrangeiro verdadeiramente apaixonado pela música produzida em solo brasileiro no último século XX. Arigato, Tanaka!

- Como começou a sua paixão pela Música Popular Brasileira, em especial, pelo samba?
- Foi em 76 ou 77. Existia uma pequena loja em Tóquio que começava a importar os discos brasileiros, que ninguém se interessava naquele tempo. Eu encontrei uns 30 discos brasileiros nessa loja, que devem ser os primeiros discos brasileiros que chegaram no Japão. Nesse 30 discos tinha o primeiro e segundo disco do Cartola (da gravadora Marcus Pereira). Comprei estes dois e gostei tanto que ouvi muitas vezes. Ouvindo (claro que, sem entender o português naquele tempo) fiquei querendo conhecer o Cartola pessoalmente. Comecei a juntar o dinheiro pra viajar ao Brasil, mas só consegui comprar a passagem no finalzinho de 80, logo depois que o Cartola morreu.

-Fale da sua atividade como produtor de discos no Japão, Indonésia, EUA, onde você vem desenvolvendo atividades ligadas ao chorinho.
- Acho que e difícil explicar sobre meus projetos da Indonésia. Fiquei muito interessado quando conheci um gênero da musica indonesa, chamado kroncong, que é o choro da Indonésia. Kroncong tem influência da música portuguesa, igual ao musica havaiana, que usa o instrumento bem parecido com o Cavaquinho Brasileiro etc... Aí surgiu uma idéia na minha cabeça, que foi um (re) encontro dos irmãos, o choro e kroncong. Este foi realizado quando produzi os discos da Waldjinah, que é a Elizeth Cardoso da Indonésia. Gravei umas musicas acompanhado por os músicos de kroncong e os chorões juntos. Foi uma maravilha.

- Os japoneses têm samba no pé?
- Tem gente que sabe, tem gente que não sabe, como todos os brasileiros não sabem sambar.

- Você acredita que o samba vem encontrando boa acolhida no mercado do japonês. Dá para competir com a bossa ou o gênero é algo para um público especifico?
- Nao. O samba não vendeu (e não vai vender) tanto como a bossa nova, que e uma coisa bem especial pra os japoneses. Tem gente que gosta de sambar no clube ou tem gente que gosta desfilar no carnaval, mas eles não ouvem tanto o disco. Quem ouve mais disco, é o bossanovista, como sempre.

- Há novidades suas para o mercado brasileiro?
- A gravadora Deckdisc está lançando um álbum duplo, chamado “Uma Historia do Choro”, que e meu novo trabalho. Ganhei o mais recente Prêmio Tim de Música com esse disco.

- Comente um pouco sobre estes sete Cd´s de samba que a gravadora Atração Musical está disponibilizando no Brasil.
- Pra mim os primeiros discos que produzi no Brasil são como se fossem meus filhos. Gastei tudo que tinha, sem ter esperança de ser recuperado, mas quis fazer. Não sei porque. Nunca fiquei tão maluco por musica na minha vida.

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