terça-feira, 17 de julho de 2007

A Todo Vapor



A rigor, o que dizer de uma época que juntou o espírito festivo das discotecas e o braço armado da ditadura militar então já mais do que estabelecida? A imagem kitsh do apresentador Flávio Cavalcante e a sensualidade abusada de Sonia Braga? O rock tropical dos Secos & Molhados e o ufanismo declarado da dupla de cantores e compositores Dom & Ravel?

Pois é bicho, estes e tantos outros contrários da década de 70 estão de volta através de dois novos livros de Ana Maria Bahiana: “Almanaque dos Anos 70” e “Nada Será Como Antes – MPB nos Anos 70”. Jornalista e escritora de responsa, ela abriu o baú de um dos períodos mais ricos da vida brasileira. Trata-se, sobretudo, de dois olhares distintos e individuais. Não há ranço saudosista, mas sim objetividade na abordagem dos assuntos.

Fartamente ilustrado, “Almanaque Anos 70” apresenta uma visão panorâmica da época através de oito temas : ícones, estilo, música, verbo artes & manhas, curtição, esporte e mídia. Um ampla e suada pesquisa, levou autora a construir todo o imaginário daquele momento de transformações e que tantas marcas deixou em diversas áreas do País.

No caso de “Nada Será Como Antes”, trata-se de um apanhado de reportagens que Ana Maria havia produzido para jornais e revistas do período. Lançado pela primeira vez em 1979, este clássico do jornalismo musical brasileiro volta à baila inteiramente repaginado. O volume traz novidades, como anotações, a carta-prefácio do jornalista Arthur Dapieve e um capítulo com textos inéditos e censurados, chamado “Do fundo do baú”.

Carioca da gema e movida à música, cinema, literatura e o que pintar pela frente, Ana Maria é um dos ícones do jornalismo cultural no Brasil. Uma carreira que cobre três décadas de reportagens e comentários sobre a cultura no Brasil e no exterior, em imprensa, rádio, televisão e internet.

Seu brilhantismo a levou ocupar lugar de destaque em redações dos principais veículos informativos nacionais: Jornal do Brasil, O Globo, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Opinião e Rolling Stone. Foi assim também nos Estados Unidos (New York Times, Syndicate, Escape e Beat), Austrália (Lê Film Français, Follow Me, HQ e Cinema Papers). De 1992 a 1995 foi ainda responsável pelo escritório de Los Angeles da revista inglesa Screen International.
Segue abaixo um bate-papo realizado com a “mestra” Ana Maria nas últimas semanas através de e-mail. Uma conversa informal em que ela fala, entre outros temas, de alguns momentos da carreira, da cena musical recente no Brasil e sua incursão pelo Cinema.

- Com se deu à idéia de escrever “Almanaque dos Anos 70” e relançar “Nada Será Como Antes – MPB nos Anos 70”?
- Uma na verdade não teve a ver com a outra.... Estava conversando com a Senac há muito tempo sobre o relançamento do “Nada...” quando a Ediouro me propos o Almanaque. O meu trabalho na reedição do “Nada” terminou quase um ano antes do Almanaque _ foi pura coincidencia os dois terem saído tão perto um do outro. A minha vontade de reeditar o “Nada” era de dar uma nova leitura àquele material, que há muito tempo estava fora d corculação.

- “Nada Será Como Antes” é um marco de nossa bibliografia pop musical e comportamental. Seus textos, embora aparentemente datados, conservam um frescor pouco comum nestes tipos de textos jornalísticos, escritos, muitas vezes, no calor da hora. Como você conseguiu chegar a este resultado?
- Não tenho muita noção, não. Talvez porque eles fossem intensamente vividos, e creio que as coisas vividas preservam essa energia, que as torna sempre presentes.

- “Almanaque dos Anos 70” é um dos grandes sucessos editorias do Brasil nos últimos anos. Esta acolhida do público lhe surpreendeu?
Um pouco. Esperava uma boa reação, mas foi muito maior que o esperado. Fico super feliz porque, entre outras coisas, indica que consegui falar com um outro público, ou com vários públicos, independente de idade.

- Para muitos, a década de 70 foi um período sombrio e inexpressivo, até mesmo cafona, seja no modo de se vestir ou de se expressar artisticamente. Você acredita que os livros contribuem para rever todos estes pontos de vista, revelando outras facetas deste momento brasileiro?

-Creio que sim. Quanto mais completo o olhar, melhor!

- Como foi fazer parte da equipe que compôs as 36 edições (foi o que durou, né?) da primeira versão brasileira da revista “Rolling Stone”, um dos publicações-símbolo do pop/rock, nos anos 70? O que achou da nova versão, lançada há menos de um ano?
-Acho uma boa revista. É algo complemente diferente do projeto e metas da original, mas os tempos são outros e a própria RS é outra.

- Você costuma acompanhar o jornalismo cultural feito hoje no país? Qual a sua visão dele neste momento? Alguma coisa se perdeu pelo caminho ou houve evoluções consideráveis ao longo das últimas décadas?
- Preferia não responder esta pergunta. Acho que não tenho todos os elementos necessários.

- Novas mídias e seus suportes avançados tem provocado uma transformação acelerada no modo de produzir e consumir música no mundo. Como fiel defensora do bom e velho MP3, por exemplo, como se posiciona diante destes fenômenos tecnológicos?
- Enquanto estiverem a serviço da criatividade humana, estou navegando por essas ondas etéreas. Sou daquelas que adora uma novidade... ouço falar, vou conferir.

- Você tem acompanhado a cena roqueira/pop/mpb brasileira? Poderia destacar algum (s) nome (s)?
Gosto de Céu, Cibelle, Celso Fonseca, Bebel Gilberto. Mas na verdade tenho ouvido mais coisas muito antigas, ou então de super-raiz.

- Sua incursão pelo cinema aconteceu no ano, com o lançamento do de “1972”, filme no qual você foi co-produtora e roteirista. Há planos de sua para mergulhar novamente pelo universo da 7ª Arte?
- Com toda certeza. Com o projeto certo e as pessoas certas, estou dentro.

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